sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Ventos Alísios

A rua parecia sempre quieta, apenas as folhas das árvores dançavam ao sabor do vento naquela tarde de uma Copacabana suave sem igual. Logo ali, numa janela que permanecia sempre fechada, um olhar morava entre as cortinas de um prédio entediado.
A janela emoldurava a tristeza monocromática de alguém que assim como a fresta, permanecia fechado há muito tempo.Mesmo em festividades coloridas como as de final de ano, onde fogos de artifício saltavam no ar trazendo uma atmosfera de encanto, ainda assim, aquele olhar entrecortado pelas cortinas persistia em uma alegria cinza.
Há muito que esse olhar não enxergava motivos para deixar o papel de observador e poder vivenciar um protagonismo em sua própria vida. Esse olhar estava cansado de todos os outros que haviam desviado do antigo brilho que ali morara um dia.
Certa feita, em uma dessas chuvas de verão, inesperadamente a vidraça da janela quebrou-se com uma ventania forte que chegara para mudar as coisas de lugar. Com o buraco na janela, o olhar não pode controlar o que queria ver ou sentir, mas ficou estranhamente feliz pela bagunça boa proporcionada por essa ventania e pelo remédio displicente que a mesma trouxe para seus dias.
E assim, o olhar deixou que a ventania ficasse, mudou os vidros da janela e o olhar por detrás dela transformou-se numa vidraça de percepções e sentimentos que ele se permitiu sentir a partir do momento em que, assim como a janela, se abriu. Dessa forma, a ventania tornou-se brisa trazendo calmaria e cor para os dias daquele olhar.
Hoje, o olhar e a ventania que se tornou brisa não dividem mais o mesmo endereço. Por muito tempo eles experenciaram momentos incríveis e que estão guardados com carinho na memória deles. 
O olhar continua morando no mesmo prédio, hoje não mais visto como entediado. Já a ventania, mudou-se  para uma casa, mas não deixa de mandar vez ou outra um cartão postal onírico que faz com o que olhar sorria e sinta uma saudade azul dos dias vividos(e vívidos) ao lado dele.
 

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

A percepção de pai real e a vida com o pai real

Eu queria que por um segundo, o tempo pudesse voltar e nos dar a família que eu queria. Eu queria que entre essas quatro mulheres fortes que se ergueram com muita dificuldade, existisse uma mão de Pai presente para nos dar um apoio a mais. Queria almoços de domingo em casa cheia, com você rindo, chamando os amigos para um churrasco e nós acordando com aquela zuada boa de se sentir que se tem com quem contar. Eu queria que você lembrasse dos nossos aniversários, fosse as reuniões de colégio ou pelo menos aparecesse no dia de homenagem aos pais. Ninguém na escola conhecia nosso pai. Talvez nem nós conhecíamos. Eu queria que você não tivesse medo de ficar. Que você não nos deixasse todo mês sem saber ao certo quando ia voltar. Queria que você amasse minha mãe tanto quanto ela te amava. Que cuidasse de nós de madrugada quando estavámos doentes. Que chorasse o nosso choro quando não  alcançássemos algo que queríamos muito. Todas nós precisávamos de você e você nem percebeu. Ou percebeu e preferiu evitar. Se eu pudesse te ver hoje, por uns minutos que fosse, te perguntaria por que você não quis ser nosso pai quando tudo que nós precisávamos era de um. Espero que onde você esteja já tenha feito essa reflexão e visto o tanto que faltou conosco e o quanto de amor deixou de ganhar por apenas ter escolhido não está ali. Feliz dia dos pais para você que não foi nosso pai em vida, porque talvez não soubesse o que era ter um. Você não teve um, mas nem se quer se deu a chance de tentar ser como você gostaria que o seu fosse. Você teve 3 chances lindas chamadas Karla, Soraya e Karine e elas cansaram se esperar, estão formando suas famílias e o nome do pai delas é Solange. 

terça-feira, 11 de abril de 2017

Calma, vai ficar tudo bem.

Ei, menina! Calma, tudo vai ficar bem. Eu sei que tá tudo meio misturado e acontecendo ao mesmo tempo agora, mas tudo está caminhando e a vida é isso...é ir e vir. Deixe que venham as atribuições, os desafios, o cansaço, o medo de não conseguir, o medo de não conseguir superar o medo e vá. Corra! Seus passos são largos, menina. Você nunca andou devagar mesmo. Quando tentou desacelerar, tropeçou. Mas soube levantar, cuidar dos machucados que a queda provocara e aprender com a dor. Certamente é a pior forma de aprender, mas garanto que é bem efetiva. Deixe que tudo flua, que tua vida corra como água de um rio cristalino, onde tu possas seguir sempre vendo o teu chão lá no fundo. Segue, menina. Mal algum há de vir por querer seguir teus sonhos, ainda que as 24h do dia pareçam pequenas para eles. Sonhos não tem tamanho, tem alma. Deixe o medo ir embora, ele não é das visitas que costumam ficar muito tempo em tua casa. Sobre o mais, viva(ainda que aceleradamente) tudo o que a vida está a te proporcionar. Viva, menina!  Cresça! E quando uma mulher tu te tornares, olharás pra trás sem receio de ter deixado nada importante caído pelo caminho. 

domingo, 8 de janeiro de 2017

Uivantes

Em alguns dias a dor que tu me causastes lateja como se ainda vivesse
Tu e a dor
Porém em vida, já eras morto
Podes depois de morto viver a doer assim?
A ausência das coisas que não fizestes,
Doem mais do que a presença do males que me fez
O silêncio das coisas que eu sempre esperei ouvir de ti,
Ecoam em meus ouvidos como zumbidos de corvos que anunciam uma morte muito esperada
A morte das palavras que tu nunca pronunciastes, a vida nas frases que em mentira tu me pronunciavas e a paz que me roubastes, quando sem sã consciência do que estava fazendo, me cativou.

terça-feira, 4 de outubro de 2016

Alguma vez em algum lugar eu li alguém que disse que escrevia pra se salvar e é exatamente assim que eu me sinto em dias como hoje. Onde tudo anda vagarosamente contrastando com a velocidade dos meus pensamentos, mas com a velocidade igual ou menor a do meu poder de me mover daqui. Quando adolescente eu tinha blog para aparecer, para ser notada. Hoje em dia eu tenho um blog meio que para desaparecer um pouquinho da realidade, para deixar de lado os pesos e as pressões ou até mesmo para traduzi-los aqu em palavras e assim sentir menos. As palavras sempre me salvaram de mim mesma, nunca dos outros. Aos outros elas servem apenas para denunciar-me, desvelar aquilo que eu não quero que vejam, que saibam, porque talvez eu não gostaria de ser, mas que não há como encobrir. Estou caminhando prestes a verdades que podem me causar perdas, dores, abstinências, desistências. Mas também quero pensar que estou caminhando pra me encontrar, pra colar os pedacinhos de mim que eu for achando por aí, para desespalhar) essas vontades tão sem foco ou razão e principalmente, prioritariamente, para caminhar de mãos dadas com quem realmente sou, sabendo de minhas agruras, meus defeitos e falhas, mas mesmo assim segurando forte nessa minha mão que carrega minhas imperfeições também. De alguma forma, as tenho por alguma razão e quero saber o por que. Eu que sempre fui curiosa desde infante fui perdendo a vontade de descobrir os por quês das coisas de acordo com o avanço da idade. E talvez tudo que eu ganhe nesse caminhar seja essa vontade renovada(e às vezes negada), de querer ser e estar com tudo que eu realmente sou.

Sobre(viver)

Eu cresci entre espinhos e dificuldades pra fechar as contas do mês. Marcaram minhas memórias com lembranças ruins quando eu ainda nem entendia o que era bom ou ruim. A cabeça não entendia o que era, mas o coração doía e os olhos pareciam entender também, derramando em lágrimas a dor de nada entender, mas tudo sentir. Eu não sei até que ponto essas coisas me marcaram como gado, mas elas me acompanham. No entanto, se tem algo que aprendi é que não posso atribuir meus sucessos ou fracassos aos outros, ambos são méritos meus. E eu preciso lidar com eles. Preciso lidar com a necessidade de saber pra onde caminhar, sem que ninguém precise indicar. Preciso confiar em mim. Preciso saber que minha vida, minha história, sou eu quem construo e que por mais que obstáculos possam aparecer, sou eu quem decido como vou ser atingida, posso me esquivar ou enfrenta-los. Sempre há possibilidades, o que é preciso é enxergar. Ver que mesmo diante da vontade de não levantar da cama pela manhã, há todo um universo lá fora onde eu posso interferir, contribuir e transformar. Pra quem cresceu entre espinhos, se deixar levar pela maré não é MAIS uma opção.

sexta-feira, 27 de maio de 2016

O medo contínuo de todos os dias: o de ser mulher.

PAH! 30 HOMENS ESTUPRAM MENINA DE 16 ANOS ALCOOLIZADA. É manchete, todo mundo fala, todo mundo tem uma opinião a dar. Eu acho ótimo, porque se a cada 11 minutos acontece um estupro no Brasil é sinal de que isso precisa mesmo ser discutido e muito. Mas o que você faz pra evitar que essas coisas aconteçam todos os dias? Você é homem, tem amigos homens, quando algum te manda foto ou vídeo que fez de alguma garota como esse o que você diz a ele? Você ri? Você repassa o vídeo? Ou você simplesmente não faz nada como estes que você está criticando agora? Eu acho que antes da gente apontar o dedo pros defeitos do outro e pensar no que o outro tá fazendo pra deixar o mundo um lugar melhor, nós devemos olhar pra nós mesmos(lá no fundinho) e pensar nas mínimas atitudes cotidianas que podemos realizar pra fazer a diferença. A solução está nas coisas simples. Num conselho que ele dá a um amigo dele, na forma como trata suas parceiras, sua mãe, suas irmãs(as mulheres de sua vida) e fala delas, na forma como defende a liberdade sexual que à elas é legítima.Tudo e só o que a gente quer é respeito. É poder andar na rua sem medo das cantadas que nos ofendem, é poder ir pra festa só pra dançar e saber que não vamos ter nosso cabelo puxado por um homem primata que quer algo com a gente. Quer poder usar roupa curta e não ser estereotipada de puta. A gente quer ter nosso corpo, nossas regras. A gente só quer respeito. Quem dera todos homens pudessem ver que estuprar é extremamente simbólico e que muitas vezes já fizeram isso sem nem perceber com as mulheres que passaram por suas vidas. Somos muitos diferentes, mas queremos coisas iguais: respeito, dignidade e humanidade(para o homem e para a mulher). A gente não quer arma pra se proteger, a gente não quer castração química pra homens, a gente quer não ter medo de ser mulher. LI-BER-DA-DE!